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Ressacas não significam elevação do nível do mar

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Toda vez que observamos eventos costeiros como ressacas com ventos de rebote causados por sistemas meteorológicos, já aparecem os “especialistas” repetindo a história de que são evidências de que as “mudanças climáticas” estão fazendo o mar subir, alterando o Nível Médio do Mar (NMM). Não avaliam nenhuma contextualização da complexidade de cada quadro que os envolve, não apenas com a situação meteorológica e não climática, mas da posição e do recorte geográfico frente ao oceano, o sentido de propagação de ondas e a fase da Lua.

Neste inverno, tivemos pelo menos duas ocorrências mais notáveis, sendo que a primeira ainda remonta o fim de julho, apresentando estragos significativos quanto ao volume de areia lançado contra avenidas e calçadões da orla marítima, especialmente a mais urbanizada do município de Santos (SP). A segunda, bem mais amena, ocorreu nos dias 26 e 27 de agosto.

Os quadros que apresentam tais condições são bastante específicos no tocante aos seus componentes, mas podem variar bastante conforme as combinações entre eles. Obrigatoriamente teremos a presença de um centro de baixa pressão atmosférica na superfície de grande escala, maturando ou já consolidado como um ciclone extratropical (CET) próximo da costa Sudeste do Brasil, ou um pouco mais afastado para dentro do oceano. Como a força dos ventos é proporcional à queda de pressão, quanto mais baixa for a pressão no núcleo do CET, mais forte serão os ventos ao redor do núcleo, diminuindo conforme se afastam.

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Esse é um ponto interessante porque a severidade da ressaca na costa está ligada à intensidade do CET e à distância da posição geográfica do seu núcleo, permitindo uma gama muito grande de possibilidades, especialmente quando entra o segundo fator de alta importância, que é o astronômico, representado pela sua combinação com a fase da Lua.

Se a fase for Cheia ou Nova, teremos marés com grande amplitude, ou seja, há uma diferença marcante entre a maré baixa e a alta. Nas fases Crescente e Minguante, as amplitudes são muito menores. Com mais este elemento, a gênese do processo aumenta e varia conforme as horas, amplificando ou reduzindo o fenômeno. 

Assim, enquanto o deslocamento das ondas do mar em superfície é ocasionado pela força do vento, podendo perdurar por dias, as marés vão se alterando a cada seis horas. Poderemos ter um CET mais fraco bem próximo da costa, com fase da Lua em Cheia e maré alta fazendo mais estragos do que um intenso CET mais distante, com Lua na fase Crescente, por exemplo.

As recentes ressacas no Brasil

Voltando às ocorrências recentes no Brasil, o primeiro caso começou na madrugada de 29 de julho, quando o litoral de Santos foi tomado, mais uma vez, por intensa ressaca que permaneceu até o dia seguinte. A condição astronômica era de Lua Nova, subindo para um oitavo de crescente, significando que a diferença entre as marés ainda estava bastante pronunciada e que durante a maré alta, ou cheia, haveria o perigo da água do mar cobrir as praias.

O quadro começa a se formar antes, por volta do dia 27 de julho, sobre o Uruguai e leste da Argentina, quando um sistema de baixa pressão atmosférica em superfície de grandes proporções, associado a um sistema frontal, maturou para a formação de um grande CET continental, às 3h do dia 28. Poucas horas depois, o sistema dirigiu-se ao oceano, ganhando latitudes enquanto se intensificava rapidamente (figuras 1A a 1E).

Figuras 1A a 1E — Recorte de imagem GOES-19 canal infravermelho mostrando a evolução do Ciclone Extratropical de 27 a 29 de julho de 2025 na costa do Brasil. As setas indicam o sentido do vento (Fontes: NOAA e Inmet, 2025)

Pela sua envergadura, com mais de mil quilômetros de extensão e abarcando uma área significativa do Atlântico Sul, os ventos intensos derivados da baixa pressão atmosférica do centro do ciclone acabaram por empurrar as águas superficiais do mar no mesmo sentido de circulação do sistema, que no Hemisfério Sul gira de forma “horária”. Devido ao posicionamento geográfico do CET, os ventos na sua retaguarda forçaram uma dispersão das ondas, empurrando-as por quilômetros para noroeste, de encontro às costas do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná, e para o norte, contra o litoral de São Paulo.

Além da queda das temperaturas devido ao ar frio que escoou por um corredor de sudeste para noroeste, conectado mais ao sul pelo próprio ciclone ao setor do Mar de Weddell, na região da Antártida, as ondas provenientes dos ventos deste CET, cujo centro estava a mais de 500 km da costa do Brasil foram suficientes para causar o avanço significativo do mar, elevando o seu nível temporariamente, especialmente na orla de Santos, mais uma vez, com a tradicional cena de sumiço das praias, avenida alagada e grandes vagas batendo na murada de retenção, além dos borrifos de água na área da Ponta da Praia, entrada do Estuário de Santos.

O ciclone de agosto

Para o segundo quadro, em 26 de agosto de 2025, observou-se uma ocorrência bem mais branda, ocasionada por um centro de baixa pressão em superfície não tão intenso. Esse novo sistema meteorológico derivou de outro imenso ciclone extratropical do tipo Shapiro-Keyser que havia passado poucos dias antes (de 22 a 25). A nebulosidade do dia 26 delineava a posição de seu centro de baixa pressão que desta vez se posicionara sobre Santa Catarina. A Lua se encontrava na sua fase Nova, quase chegando a um oitavo de fase Crescente, indicando que as amplitudes das marés seriam elevadas, com a maré alta favorecendo a força da ressaca, caso o sistema maturasse.

Contudo, com o passar das horas, como o sistema se manteve sobre a área continental, sua maturação não foi robusta o suficiente. O centro de baixa pressão atingiu o oceano por volta das 6h do dia 27. Na área ao sul do centro, a circulação dos ventos soprou de leste, seguindo a regra de giro “horário” do Hemisfério Sul, ocasionando ondas maiores contra a costa dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Paraná e São Paulo também apresentaram mar agitado, mas nada comparado com a força do evento de julho (figuras 2A a 2E).

Figuras 2A a 2E — Recorte de imagem GOES-19 canal infravermelho mostrando a evolução do centro de baixa pressão quase maturando para um ciclone extratropical em 26 e 27 de agosto de 2025. As setas indicam o sentido do vento (Fontes: NOAA e DSA)

Esses quadros são os responsáveis pela elevação temporária do nível do mar, os quais não podem ser associados com mudança real do NMM. Vale lembrar que temos situações inversas, onde há o predomínio de um grande e intenso anticiclone semi-estacionário, onde predomina calmaria completa, ou seja, sem vento, céu totalmente livre de nuvens e fases da Lua Cheia ou Nova, onde as amplitudes de maré são bastante significativas. Conforme a situação, o mar regride absurdamente e não é tão raro de se observar, por exemplo, no litoral paulista, a pequena Ilha da Pombeba ligar-se à Praia de Pitangueiras, no município de Guarujá, que coexiste com a Ilha de Santo Amaro. Tais condições não ocorreriam com o NMM subindo, como tanto alardeiam.


Ademais, eu acompanho esses casos especiais desde 2004. Os eventos de julho e agosto nem foram os mais intensos que tivemos. Por exemplo, entre o fim de abril e início de maio de 2005, a ocorrência de um grande CET (Fig.3A a E), combinado com fase da Lua favorável de Minguante para Nova, causou mais danos na orla santista do que o observado recentemente. Na ocasião, até mesmo as muretas de retenção da Ponta da Praia, em Santos, chegaram a colapsar com a força dos vagalhões gerados por ondas de até 3 metros de altura.

Figuras 3A a 3E — Recorte de imagem GOES-12 canal infravermelho apresentando o rápido desenvolvimento de um imenso ciclone extratropical que ocasionou as fortes ressacas há 20 anos, de 30 de abril a 9 de maio. As setas indicam o sentido do vento (Fontes: NOAA e DSA)

Cada ocorrência tem as suas particularidades e é assim que devem ser observadas e estudadas. Sem alardes desnecessários, pois a adaptação e a convivência com o ambiente costeiro marinho ocorrem conforme as necessidades humanas e não o contrário. Com a chegada da primavera, o corredor de ciclones extratropicais tende a ganhar mais latitudes, deslocando-se em sentido ao Oceano Polar Antártico, confinando-se para além da latitude de 40oS. Isso não significa que algumas ocorrências de quadros que combinem a formação de um CET e fase da Lua não possam aparecer em latitudes mais baixas. Em geral, da primavera até o verão, esses casos tendem a se concentrar mais na área central do Atlântico Sul e as ondas geradas por ventos de leste, ao sul dos sistemas meteorológicos, podem alcançar a costa dos Estados das regiões Sul e Sudeste do Brasil de forma mais branda. Sempre é bom lembrar que os serviços meteorológicos e oceanográficos devem ser consultados para se conhecer o estado do mar e das praias antecipadamente.

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Fonte:Revista Oeste

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