Embora o primeiro mês da primavera esteja bastante seco, semelhante aos outros últimos anos, incluindo o distante 1993, a pergunta que precisamos fazer neste momento de transição é sempre a mesma: estamos preparados para o novo período de chuvas que se iniciará nas regiões Sul e Sudeste e afetará as cidades mais populosas do Brasil?
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A pergunta inicialmente parece ter um tom de retórica, tendo em vista que se passam os anos e não observamos nenhuma medida inteligente, de fato, para a resolução dos problemas que afligem muitas famílias praticamente todos os anos. Devemos considerar, nessa discussão, alguns fatores, como o fato de que o país está em área tropical, onde grandes células de chuvas são bastante corriqueiras.
Sabemos muito bem que não existe no mundo um sistema de drenagem que consiga atingir a eficiência de 100%, quando é submetido a aguentar a carga de precipitação de um intenso cumulonimbus, a nuvem de trovoada. Quando organizados em várias células, típica situação nesta fase de transição da estação de primavera, poderemos observar outros fenômenos de escalas intermediárias como as Linhas de Instabilidade (LI), os Complexos Convectivos de Meso-escala (CCM) ou ainda outras pertencentes às escalas maiores como as oriundas de sistemas frontais e da presença da Zona de Convergência Inter-tropical (ZCIT) na região Norte e Nordeste do Brasil.
Contudo, isso não pode ser desculpa para que os responsáveis administrativos não tomem as devidas providências para amenizar ou resolver as situações de risco. Se assim fosse, a Flórida, nos EUA, que todo ano “recebe” um furacão, ou nas proximidades ou cortando o Estado ao meio, estaria em um caos completo permanentemente. E não estamos a falar sobre apenas colocar plaquinhas informando “zona de risco de enchente”, artifício inútil que não previne de nada.
Um segundo ponto é a forma como se desdobrará a estratégia para a chegada das chuvas, inaugurando o novo ano hidrológico em várias regiões do país que anunciam o conturbado período de verão. Além das chuvas de alta intensidade, que trazem enxurradas ligeiras nas cidades, ou os alagamentos e as inundações tardias em leitos de rios, as células de trovoadas sempre ocasionam fenômenos eólicos como as frentes de rajada, as micro e macro-explosões, tanto secas quanto úmidas e, ocasionalmente, até tornados e trombas d’água. Todos esses fenômenos são problemáticos para as estruturas urbanas.
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A limpeza das galerias de escoamento está em dia? Como estão as milhares de árvores que os governos “verdinhos” ou seguidores da seita ambientalista plantaram sem critério algum pelas cidades? Foram realizados os devidos acompanhamentos? A saúde das árvores e seu estado estão devidamente tabelados? Como estão as podas? Abateram as árvores perigosas, inclusive atendendo aos moradores que antecipadamente alertaram para o perigo iminente? Verificaram se as raízes destruíram o calçamento ou atingiram tubulações? Pois é, tudo isto tem um custo para o cidadão, portanto, não se trata de simplesmente sair plantando árvores por aí.
O município de São Paulo anunciou em meados de setembro que inaugurará um serviço de escaneamento de ruas “inteligente”, onde sensores embarcados em veículos especiais adaptados farão o mapeamento total das fachadas de forma a se identificar as árvores, espécies, formatos, status, além da localização. Segundo a prefeitura, isto servirá como base na tomada de decisões operacionais. Contudo, os profissionais envolvidos já disseram que a proeza demorará três anos para ser concluída. Nessas condições, até a informação chegar à linha de frente operacional, já será notícia velha, pois em três anos, a vegetação estará muito alterada em relação ao registro anterior. Pois é, milhões de árvores plantadas dão nisso. Muita coisa para gerenciar, além de outro serviço que vai custar alguns milhões para os cofres públicos.
Se a bateria de questionamentos sobre árvores foi preocupante, espere só pelos próximos, pois também se torna de alta relevância saber como estão os serviços de manutenção e prevenção na rede secundária de distribuição de energia elétrica. O período de estiagem, que ocorre normalmente no inverno na maior parte das regiões do país, é o mais propício para se elaborar um programa preventivo de manutenções, verificando quais equipamentos apresentam pequenas avarias, fugas de corrente e até mesmo interferências da natureza, com galhos de árvores tomando fios e postes. Será que as concessionárias já executaram o mapeamento destas zonas de risco? Foram realizadas todas as podas necessárias onde temos a mistura, “altamente inteligente”, entre fios e árvores dentro das cidades?

Recordemos o cenário de caos urbano ocorrido há um ano no Estado de São Paulo, mas principalmente os transtornos observados na capital. O dia 11 de outubro de 2024 foi digno de entrar para a história da cidade de São Paulo, quando células de trovoadas, oriundas de perturbações de um sistema frontal, deslocaram-se rapidamente pelo Estado, trazendo chuvas. Contudo, foram os ventos intensos que ocasionaram mais estragos, deixando cerca de três milhões de pessoas sem energia. Centenas de árvores tombaram pela cidade, mas também algumas torres de transmissão e postes elétricos. A restauração da energia demorou de três dias a mais de uma semana, dependendo da região.
Apesar de tudo, não observamos, até o presente momento, nenhum planejamento de contingência, seja do Estado, seja do setor privado (concessionárias) em elaborar um plano preventivo para a chegada das próximas chuvas. Preparemo-nos para receber bananas novamente, conforme o quadro meteorológico que se apresentar. Enquanto isto, as contas de energia sobem sem parar; pagamentos indevidos de ICMS não foram restituídos automaticamente, mesmo que a causa já esteja decidida pelo STF; e a população continua bancando a farra energética brasileira da “transição energética socialmente justa”, seja pelo alto valor, seja pelos “encargos” aplicados imoralmente. É o dinheiro pelo dinheiro e não pelo serviço de utilidade pública, então, será que mais uma vez veremos os sistemas de cunho estratégico do país serem desnudados, mostrando sua fragilidade?
Se em um nicho fechado que são as cidades as preocupações passam longe, o que dizer então de um estado inteiro? Vejamos as pessoas que moram no Rio Grande do Sul, onde municípios e até mesmo a capital ainda não se recuperaram dos transtornos das grandes inundações ocorridas de abril a maio de 2024, proveniente de uma combinação de quadros meteorológicos com sistemas frontais e a ocorrência de El Niño?

No momento ainda estamos em um período de transição entre a fase neutra para La Niña do fenômeno oceânico-atmosférico El Niño/Oscilação Sul (Enos). Isto significa que, quando a situação mudar, haverá novamente alta probabilidade de chuvas torrenciais no repetir dos quadros. Portanto, esse tempo intermediário deveria ser utilizado para que os preparativos fossem realizados com o máximo de urgência. As adequadas manutenções em diques e comportas, sistemas de bombeamento e obras de infraestrutura necessitariam estar na agenda de alta prioridade. Aqui está o lugar onde os recursos públicos deveriam ser aplicados, resolvendo problemas de verdade.
Enquanto isso, fábulas de dinheiro foram e ainda são gastas com a patética reunião climática, o carnaval fora de época da COP-30 de Belém, Pará, no Brasil. A pretensão para a estupidez de “consertar” o clima global, baseada em premissa falsa, necessita de mais verbas. No mesmo momento, pessoas pobres ou pequenos agricultores são removidos de seus lugares porque matagal virou “área de preservação” e nas grandes cidades, as vítimas das inundações oriundas da omissão e descaso, não interessando a sua classe social, continuam a amargar com os prejuízos, só aguardando a próxima ocorrência. A natureza? Ela vai muito bem, obrigado! As pessoas? Essas ficaram em segundo plano e deixaram de ser prioridade. O homem, como o objeto em si da racionalidade, já saiu do centro do Universo faz tempo. Agora, o centro das “preocupações” é outro. Pena que a maioria das pessoas ainda não acordou para isso.
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Fonte:Revista Oeste








