Terceiro ministro da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) a votar no julgamento do suposto golpe de estado, Luiz Fux foi voto divergente. Ele rejeitou a acusação de organização criminosa armada imputada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a outros sete réus do chamado núcleo 1.
Fux divergiu do relator do caso, Alexandre de Moraes, ao apresentar seu voto sobre o mérito das acusações.
Anteriormente, ao analisar as questões preliminares levantadas pelas defesas dos réus, Fux havia votado pela anulação do processo por entender que a Corte não é competente para julgar o caso. O ministro continuará fazendo a análise do mérito do caso na tarde desta quarta-feira.
O voto de Fux sobre a acusação de organização criminosa foi fundamentado na falta de elementos específicos exigidos pela legislação penal para configurar o delito de organização criminosa. Segundo Fux, a acusação apresentada pela PGR não demonstrou que os réus teriam se reunido para praticar uma série indeterminada de crimes.
Document Dump: “tsunami de dados” no processo
O ministro ainda afirmou em seu voto que houve violação das garantias de defesa dos réus. Ele argumentou que a quantidade de informações e provas apresentadas foi grande – mais de 70 terabytes de dados –, e a forma como esses dados foram disponibilizados para os advogados de defesa foi tardia e sem identificação prévia.
“Por isso, senhor presidente [Alexandre de Moraes], em razão da disponibilização tardia de um tsunami de dados – data dump –, sem identificação suficiente de antecedência minimamente razoável para os atos processuais – e eu confesso que tive dificuldade para elaborar um voto imenso –, eu acolho a preliminar de violação à garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa e reconheço a ocorrência de cerceamento e por consequência, eu declaro a nulidade do processo desde o recebimento da denúncia”.
Mudança nas regras do foro depois da acusação da PGR
O ministro também abordou a questão da competência originária do STF e as modificações que ela sofreu, especialmente em casos de prerrogativa de foro. “[…] nos casos de prerrogativa de foro sofreu inúmeras modificações, inúmeras modificações. E aqui eu cito todas as modificações que essa competência sofreu”. Ele denominou como uma “banalização dessa interpretação constitucional personalíssima”.
Destacou ainda que a lei veda o julgamento de uma pessoa (“ratione personae”) por um órgão diferente daquele indicado na Constituição. Disse que quando a regra é alterada, especialmente após a ocorrência de um crime, isso pode configurar a criação de um “tribunal de exceção” – um tribunal de exceção é aquele criado especificamente para julgar um caso ou pessoa em particular, o que é proibido por regulamento para garantir a imparcialidade e a segurança jurídica.
Fux continuou sua fala explicando que o constituinte buscou impedir tribunais de exceção não apenas pela criação de um novo tribunal, mas também garantindo que “uma ação e a força de ação penal fosse julgada por um órgão jurisdicional diferente daquele que é previsto nas leis”. Ele completou que o “órgão jurisdicional constitucional é absolutamente diverso do órgão constitucional ordinário, especialmente quando essa modificação da competência por resultado de uma interpretação após o crime”.
Assim, Luiz Fux explicou que o “Supremo Tribunal Federal mudou a competência depois da data dos crimes aqui muito bem apontados por sua excelência, o procurador geral da República [Paulo Gonet]”.
Quem ainda vai se manifestar
Nesta quinta-feira (11) o julgamento continua. Ainda precisam votar a ministra Carmen Lúcia e o presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin. Acompanhe a transmissão da Gazeta do Povo.
FonteGazeta do Povo